Questão Israel e Palestina e o complexo do “não posso fazer nada”
Do ponto de vista historiográfico, podemos traçar paralelos milenares que nos ajudam a entender o conflito que ocorre no oriente médio. Resumindo, o ponto de partida para o nascimento do movimento sionista, que é a busca de um estado para o povo judeu, data de 70 d.C. quando os romanos expulsam os judeus causando a segunda diáspora judaica, o que fez os judeus se espalharem pela Europa, Ásia menor e a África.
Já a partir da década de 1890, judeus começam a emigrar para a região da Palestina, na época parte do império Otomano. Lá compravam terras e começavam a formar a comunidade judaica na região. No século XIX, o movimento sionista se expande afim de uma migração em massa, assim criando o slogan “uma terra sem povo para um povo sem terra”, alegando que, pelo fato de não existir um estado soberano no local e estar sempre integrando algum império como terra colonial, lá seria o lugar perfeito para o estabelecimento de um estado judeu, garantido por suas escrituras sagradas.
Em 1917, durante a Primeira Guerra Mundial, o ministro de relações exteriores Britânico, Arthur Balfour, emitiu o que ficou conhecido como a Declaração Balfour, que dizia: “O governo de Sua Majestade encara favoravelmente o estabelecimento na Palestina de um lar nacional para o Povo Judeu…”. Após pedidos, uma linha foi incluída na declaração afirmando “que seja claramente entendido que nada será feito que possa prejudicar os direitos civis e religiosos da comunidade não-judaica na região na Palestina, ou os direitos e estatuto político usufruídos pelos judeus em qualquer outro país”.
Após a Declaração Anglo-Francesa em 1918, que previa a libertação dos oprimidos pelos turcos, Balfour se contradiz logo no ano seguinte quando não consultou os habitantes da Palestina sobre suas aspirações, contrariando sua própria declaração e a de 1918 de uma vez só. Óbvio que o povo árabe, maior em número e com mais tempo na região, ficou incomodado com a decisão pouco democrática que os deixava em segundo plano.
Após os eventos da Segunda Guerra Mundial, o movimento sionista ganha mais força, agora além das motivações religiosas, o holocausto nazista também se mostrava um forte motivo para reestabelecer a unificação do povo judeu no lugar onde Davi um dia teria reinado.
Em 1947, a ONU aprova a divisão da Palestina, dando mais território para os judeus. Na época, viviam na região 1,3 milhão de árabes e 600 mil judeus. No ano seguinte, com a saída das tropas britânica, o estado de Israel é formado.
A partir disso, diversas guerras ocorrem entre os judeus e os árabes que cada vez mais foi arrasado e impedido de lutar por seu reconhecimento como estado independente. Israel foi o grande vencedor que a cada guerra tomava mais regiões assim como outrora os romanos fizeram com eles.
A justificativa fácil de adotar é a ideia de não interferir nessa guerra, a questão é se podemos chamar isso de guerra. Israel garante o poder de existir através de sua força bélica extremamente superior à de seu inimigo, bombas e tanques submeteram os palestinos a uma situação que muitos consideram um apartheid. Com um poder similar ao de colonizadores, Israel toma pra si a grande maioria do território que um dia foi dividido e antes disso era dos palestinos.
O Hamas, cada vez mais encarado como uma organização terrorista por conta de seu braço militar, as Brigadas Izz ad-Din al-Quassam, surge em 1980 em meio a questões muito mais complicadas do que a simples denominação de malvados e bonzinhos. Enquanto a Organização pela Libertação da Palestina (OLP) representa internacionalmente o povo palestino na busca de seu território independente que coexistiria com Israel, o Hamas surge como oposição a ela, pregando a destruição de Israel. Vendo de longe parece bem simples, uma tenta pacificamente estabelecer o direito de existir enquanto o outro tenta destruir Israel. Acontece que o mundo não é um clássico do cinema em preto e branco, e essa situação é mais cinza que concreto.
Hoje sabemos que o filho de um dos líderes do Hamas cedia informações ao Mossad, o serviço secreto israelense, o que foi amplamente usado para atacar a região de Gaza. Mais que isso, de forma direta ou não, o Mossad ajudou o Hamas. Segundo o ex-funcionário do governo de Israel e governador militar de Gaza no início dos anos 1990, Yitzhak Sgeve disse ao jornalista David K. Shipler do New York Times e escritor do livro ganhador do prêmio Pulitzer, Arab and Jew: Wounded Spirits in a Promised Land que o governo havia ajudado a financiar o movimento islamista palestino, para que ele servisse de contrapeso à esquerda secular da OLP e do partido Fatah. Além dele o ex-responsável de assuntos religiosos de Israel, Avner Collen, disse ao Waal Street Journal que segundo ele “infelizmente o Hamas é uma criação israelense e que teria tentado avisar aos seus superiores contra a política israelense que ele mesmo define como a de “dividir e conquistar”. Porém não foi ouvido.
Israel muda de ideia e passa a atacar o Hamas que por sua vez faz o mesmo. Milhares de bombardeios, cercos e isolamentos em Gaza, matando milhares de civis e o Hamas, por sua vez, se tornando o grupo que mais matou israelenses em relação a qualquer outro grupo secular palestino.
Quem paga a conta são os civis dos dois lados, sendo que os de Gaza são os que mais sofrem com o bloqueio de Israel sobre seu território onde ficam reclusos sem contato com a Cisjordânia, onde se encontram as Autoridades Palestinas, e com quase 770 mil refugiados palestinos em estado de extrema pobreza. Israel alega que se defende dos ataques do Hamas enquanto bombardeia a região que diferente da sua não usufrui de bunkers e um domo de ferro conta antimísseis.
Enquanto a ONU descumpre o que prometeu em 1947 e os países se dividem com a questão, o verdadeiro perdedor dessa guerra são os direitos humanos.
Por Pedro Luís Macedo Dalcol, acadêmico do curso de História da Universidade Estadual de Ponta Grossa e estagiário na Prefeitura Municipal de Piraí do Sul